A arte demoníaca de Claudio Pastro

A Veja de 18 de abril de 2007 publicou o seguinte comentário de Cláudio Pastro sobre a demora do projeto artístico da Basílica de Aparecida:
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Os bispos e os padres diziam para mim: 
Arte é luxo. Foi um período em que isto aqui era tratado como ópio do povo. Mesmo a Missa terminava sendo muito chulé. O povo saia da m... e encontrava a mesma coisa dentro da igreja.
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A concepção de arte é extremamente restrita e etnocêntrica. É correto dizer que a arte superior é aquela orientada para a Verdade e que, por isso mesmo, um católico, por encontrar com o auxílio da Revelação e da graça, tem condições de produzir tal arte (e produzir tal tipo de arte de modo paradigmático). Agora, na medida em que se afirma que a atividade artística é eminentemente filosófica e nega que algo que não seja católico possa ser arte, entra em contradição, pois identifica a atividade racional com o que deriva dos dados revelados. Uma arte não-católica pode ser arte superior (da mesma forma que uma reflexão filosófica não-católica pode ser verdadeira), a diferença é que para se chegar a ela o caminho é mais complicado.

Quem já se prestou para fazer um trabalho acadêmico na matéria de arte sacra utilizando o livro de Cláudio Pastro, o responsável pela Catedral de Aparecida, se frusta. Ele tem umas idéias estranhas, diz que as grandes Igrejas da Europa e da América Latina foram construídas quando os homens haviam perdido a noção do que é um Templo. Os modelos que ele fez do altar, ambão, cruz, são de assustar.

Para piorar, diz que a Igreja não é a Casa de Deus, mas a casa dos homens. Se reconhece uma Igreja de Cláudio Pastro na hora, o seu rastro é indefectível.(Onde mais tem é em Brasília)

O Ocidente desenvolveu uma arte sacra suntuosa, quanto mais perfeita e punjante a Igreja, mais digna de Nosso Senhor. O Oriente tem uma concepção artística diferente, deixemos que cada um fique com suas ricas tradições, mas sem nunca desmerecer as particularidades. Cláudio Pastro vai justamente criticar esse foco de grandiosidade presente no mundo latino, para ele quanto mais simples melhor, pode ser que na visão oriental o esforço dele seja 
fantástico e precursor, mas para nós ocidentais, é uma perda de nossa rica arte sacra.

Tanto a tradição ocidental, quanto a oriental, remontam da mesma origem, bebem da mesma fonte; a Tradição, entretanto vão se modificando de acordo com as experiências particulares, o ocidental com seu caráter teológico-místico, e o oriental mais contemplativo. Nenhuma tem um grau de superioridade, mas vivem em consonância por fazerem parte da catolicidade da Igreja, entretanto sem relacionamentos artificiais, nesse caso homogeneidade não seria sinal de ortodoxia.

No Ocidente a perfeição sempre foi o atestado de dignidade pela qual a obra era oferecida a Nosso Senhor, por isso que nos grandes estilos, tirando a Renascença, vai haver um devotamento por parte dos artistas na vivência de uma vida espiritual.

O oriente cristão conservou este patrimônio da tradição da Igreja. Observa-se na sua confecção uma técnica especial, de acordo com cânones bem definidos quanto ao tema, composição, cor, harmonia do que se pretende pintar. Não é um retrato, não se pintam sentimentos ou emoções. O iconógrafo - 
o que escreve os ícones - deve ter uma preparação espiritual em contato direto com a Igreja, que o abençoa e orienta no seu trabalho artístico. Portanto, o conteúdo espiritual do ícone reside na fidelidade à tradição da Igreja, que define através de uma série de cânones e prescrições, os limites dentro dos quais o gênio do artista se movimenta, que é menos individual e mais teológico. No Ícone o artista é quase anônimo, ele é um instrumento para o Espírito Santo agir, emprestando-Lhe seu talento particular.

Enquanto no oriente a arte vai transmitir uma espiritualidade particular do autor, no ocidente a beleza da arte, como um todo, irá servir para a contemplação, é o que nós latinos chamados de via pulchritudinis, a via da beleza.

Pastro critica esse método, para ele o exemplo de arte sacra é a simplicidade.

Ainda procura transmitir a ideia de transportar para os tempos atuais a vida de Cristo - são na minha opinião - de muito mau gosto. Para mim não servem ao senso do Sagrado, não cumprem uma função estética que auxilie no rito, na compreensão da mensagem do Cristianismo.

A Arte Sacra não reproduz o misterioso mas o torna visível e compreensível. Transforma em imagens aquilo que não pode ser expresso por meio da palavra escrita ou falada. Não é o caso de Pastro. A Arte Sacra louva o belo. Essas 
iconografias estão carregadas de feiúra. Para mim, beiram a blasfêmia. 

A Arte tem obrigação de nos remeter ao belo, que nada mais é que um reflexo imperfeito da Beleza, que é o próprio Deus. Essa arte verdadeira não precisa de explicação ou conhecimento prévio, é algo que reconhecemos naturalmente. Assim, arte de verdade tem que conseguir falar aos ignorantes.



O modelo negro com a coroa de espinhos pode representar a universalidade do Sacrifício de Cristo, o que é ótimo, mas pode também ser entendida como a dominação da cultura judaico-cristã sobre as culturas africanas nas Américas. Não são poucos os exemplos de artistas que usam a simbologia cristã para criticar o próprio Cristianismo. Lembro-me de um música do Orlando Moraes (acho que é esse nome mesmo, é o marido da Glória Pires) que dizia que, por ser judeu, foi o próprio Cristo que me crucificou! É essa a intenção de uma cantora pop como a Madonna se apresentar crucificada.

A arte pode ter muitas interpretações, e parece que as pinturas horrorosas de Pastro em particular teve dois objetivos principais: mostrar um Cristo 
simplicidade da fé e, sim, causar polêmica.

A polêmica, como disse, não é o único objetivo. Porém, polêmica é hoje um meio muito comum (e fácil) de chamar atenção a alguma manifestação artística. É um apelo fraco, na minha opinião, porque a obra não chama atenção por ser boa (esteticamente, como comunicação, linguagem ou para despertar debate), mas porque choca, porque causa conflito. É como alguém tentar ganhar um debate no grito, não no argumento. Causar polêmica com a fé é algo ainda pior. Jesus já alertou do perigo de se criar polêmica por causa dEle: é feito tão grave que seria melhor que se atasse uma pedra de moinho no pescoço do infeliz e o atirasse ao mar... isso porque a polêmica não edifica, só confunde e gera cizânia.

Mostrar Cristo pela 
simplicidade, a pior maneira de se fazer isso é visualmente. A atualidade do Cristo está justamente na ação evangélica, não num transporte da imagem de Cristo para as ruas modernas. Isso porque a encarnação de Jesus Cristo só existe num tempo e num espaço determinados, pois Ele encarnou-se chegada a plenitude dos tempos. Nem se quiséssemos teríamos um Jesus no século XXI - coube a Deus escolher tempo e lugar.

Percebe como esse anacronismo tenta trocar uma forma de querigma que temos hoje à nossa disposição -- acreditar no testemunho apostólico e ter uma experiência de Deus -- com o querigma próprio da época de Jesus -- conhecê-lo pessoalmente, ou ao menos testemunhar Seus feitos em tempo real? Isso é desprezar duplamente o testemunho apostólico: retirando o testemunho da sua época e não extraindo desse mesmo testemunho sua atualidade, sua perduração no tempo. Com isso, se cai no erro de reter um aspecto da mensagem que é própria de uma época e esquecer a essência da mensagem que cabe a nós hoje. Isso confunde. Portanto, mesmo que as imagens não beirassem o blasfemo e fossem 
corretas da perspectiva da arte sacra, elas não cumpririam perfeitamente a função evangelizadora.

As pinturas são de mal gosto, pois falta a elas a harmonia. Quando se produz qualquer peça de arte, a harmonia é um dos quesitos básicos. Mas essa harmonia é algo muito mais amplo do que podemos pensar.

Os exemplos do quadro de Caravaggio (um dos meus artistas favoritos) e as pinturas do Pastro demonstram isso muito claramente.

Ambas as peças possuem elementos que podemos considerar estranhos entre si em meio às composições. Mas enquanto o quadro de Caravaggio consegue manter além da harmonia visual, uma combinação entre características comuns e discrepantes dos elementos (nesse caso, as imagens sacras em uma época diferente), são respeitadas as características fundamentais que permitem uma convivência de ambos os elementos de forma anacrônica.

Já o problema de Pastro é o da alteração de características fundamentais que acabam por desfigurar parte dos elementos do quadro, quebrando não a harmonia visual, mas essa combinação de características que completa a harmonia das fotos.

Nesse caso, o elemento abandonado é a sacralidade. Ao se inserir as imagens sacras em um ambiente 
estranho, deve-se tomar um extremo cuidado para que não ocorra esse processo de contaminação dos elementos sacros por algum outro elemento novo que seja inserido na pintura.

Nas pinturas o que ocorre é justamente isso: o ar sacro é perdido e as figuras contaminadas ficam 
desfiguradas por causa da falta de harmonia entre os elementos da imagem.

O Anacronismo nas obras de arte não é problema. Durante a Idade Média e Renascença foi comum a representação de cenas de histórias das Sagradas Escrituras e da mitologia greco-romana nas quais se encontram um castelo medieval, soldados trajados tal como no tempo que o artista realizou a obra, fosse ela uma iluminura ou um quadro. Mesmo em nossas imagens barrocas, santos e anjos usam botas, coletes com brocados, dentre outros elementos. Além disso, grandes senhores (como o clássico caso Duque de Urbino) eram retratados junto a santos, observando cenas como a crucifixão ou a natividade. O anacronismo, se por um lado, pode mostrar o desconhecimento do artista quanto ao período retratado, atualiza no tempo da obra de arte a eternidade de um evento mítico ou das diferentes passagens bíblicas.

Há elementos modernos que podem contribuir muito com a beleza e a sacralidade. Eu destaco por exemplo, a iluminação.

A Catedral de Colònia, na Alemanha, por exemplo, é gótica, linda e gigantesca (ouvi dizer que é a mais alta do mundo). Implantaram um sistema de iluminação na parte externa da Catedral que permite que toda sua beleza seja vista mesmo de madrugada, de quase qualquer ponto da cidade. E não é só uma meia dúzia de refletores, são dezenas de luzes que destacam detalhes da construção. Vi ali o bom uso da tecnologia para o sagrado.

Existe uma história interessante. O Cardeal de Santiago queria reformar uma igreja na periferia da cidade. Era praticamente uma garagem com capacidade para 100 pessoas, mas nem de perto enchia aos domingos. O Arcebispo resolveu construir uma bela paróquia, rica em simbolismo, refletindo através da arte a grandeza de Deus. Com a nova igreja a capacidade subiu para 500 pessoas. Resultado? Não havia mais espaço para todos os fiéis. Claro que a beleza pela beleza é vazia, mas dentro da 
via pulchritudinis ela serve justamente como isso, uma via, um caminho para o conhecimento de Deus, retratando Seu esplendor através do esplendor da beleza.
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Esse tipo de arte é a concretização material do pecado. Quase sempre, e podemos fazer essa generalização, os responsáveis por tais pinturas são sacerdotes moderninhos e arquitetos ou descrentes ou prepotentes que se consideram entendedores da verdadeira arte sacra. É o que Dr. Plínio chama de heresia branca, ou seja, formas de adocicar a piedade, torná-la sentimental, adotando um relativismo doutrinal em respeito ao próximo. Isso é muito presente na arte sacra, especificamente na confecção de imagens de santos. As imagens têm um caráter catequético-pedagógico a partir do momento que auxiliam na compreensão da Verdade.

Quanto mais belas e mais bem feitas mais vão conseguir exteriorizar um esplendor particular. Quem não curva os joelhos quando contempla uma estupenda imagem do Sagrado Coração de Jesus? Quem não se emociona ao venerar uma imagem de Nossa Senhora das Dores? Quem não se fortalece reverenciando a imagem de São Gabriel aniquilando o demônio? Não obstante, quando tais imagens perdem seu fundamento estético e doutrinal, se tornam vazias de sentido.

Na verdade quando esse pensamento atinge até mesmo as pinturas do altar é porque estamos vivendo um era de decadência espiritual. O relativismo doutrinal é o grande responsável por tais representações artísticas; quando se instaura o oba-oba doutrinário e o oba-oba litúrgico o oba-oba estético vem em seguida. A perda de noção do belo é também alvo das análises relativistas - a beleza não é mais um atributo de Deus, agora pode ser subjetivizada, discutida. A crise estética é reflexo da falta de compreensão de que a suntuosidade e a beleza são meios de exaltação do sagrado. Nós, os homens, dando ao Senhor o nosso melhor.

O arquiteto Duncan Stroik tem se destacado como um dos responsáveis pela revitalização da arte sacra nos EUA. Os seus projetos de Catedrais, Igrejas e Capelas se tornaram conhecidos pela beleza, sobriedade e decoro. Criou o Instituto para a Arquitetura Sacra, que edita uma primorosa revista 
exclusivamente dedicada às questões da arquitetura da igreja dentro de uma ortodoxa perspectiva católica (...) Esta revista é a mais recente contribuição para o movimento da renovação litúrgica em andamento. Alguns dos seus projetos:
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Santuário do Sagrado Coração de Jesus, St. Louis, Missouri

Santuário de Nossa Senhora de Guadalupe, La Crosse, Wisconsin
Igreja de Nossa Senhora da Santíssima Trindade, Santa Paula, Califórnia
Capela da Sagrada Família, Nebraska
Igreja de Todos os Santos, Covington, Kentucky
Precisamos de um apostolado assim no Brasil! Como dizia São Josemaria Escrivá, uma igreja deve ser um ambiente que nos leve à oração! E a estética é crucial para que o ambiente seja um local de encontro com Deus.

Veja mais em http://www.sacredarchitecture.org/

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PARA CITAR ESTE ARTIGO:

A arte demoníaca de Claudio Pastro
David A. Conceição 05/2012 Tradição em Foco com Roma.

Grupo Tradição - Vaticano II acesse:


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