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Defender o aborto: apologia ao crime?


Por Rafael Vitola Brodback, do Domestica Ecclesia

Ao defender o aborto indiscriminado não se concorreria em apologia ao crime, já que o aborto indiscriminado é crime no Brasil? Outros tipos de apologia ao crime já tiveram casos terminados em cadeia, como no caso da Banda Planet Hemp que teve shows cancelados e até estiveram preso por serem de opinião a favor do uso de drogas ilícitas.

Grande parte da doutrina tende a considerar que não se trata de apologia ao crime, visto que os pró-aborto não estariam incentivando as pessoas à prática do delito, e sim defendendo que deixe de ser crime. 


A conduta tipificada pela norma parece dar razão a essa corrente, uma vez que de fato, o delito de apologia de crime configura-se ao 
fazer, publicamente apologia de fato criminoso ou de autor de crime (art. 287, CP).

Ora, são fatos completamente diferentes a defesa do aborto, desejando e trabalhando para que ele deixe de ser considerado crime, e a defesa do próprio crime enquanto continua tipificado. Os pró-aborto não incentivam a que se faça aborto hoje, enquanto é proibido, nem elogiam os que, contra a lei, o cometem. O que eles fazem é defender a reforma da lei.

Mesmo essa defesa é um absurdo, é pecado, é errônea, não deve existir, temos de lutar para criminalizar todo tipo de aborto etc. Todavia, mesmo que seja moralmente ilícita, pecaminosa, abjeta, a defesa pública da descriminalização do aborto (e mesmo que se considere que ela poderia, por si só, ser proibida, visto que o erro não tem direito a ser defendido), ela não pode ser considerada apologia ao crime, e, portanto, não é o delito do art. 287. 


O caso do Planet Hemp é diverso das pró-aborto. A banda não só defendia a descriminalização da maconha (uma atitude condenável, mas que não é crime), como também incitava seu fãs ao uso. Ora, incitar à prática de um crime (uso de tóxicos) é apologia de crime.

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Se uma pró-aborto defendesse que, mesmo diante do atual Código Penal, que considera o aborto um crime, a mulher pudesse praticá-lo, aí sim estaria cometendo o crime do art. 287. 

Defender que o crime deixe de ser crime é uma coisa. Defender que se possa praticar esse crime enquanto é considerado crime, é bem outra. No primeiro caso temos uma atividade normal na democracia (e, dependendo do valor protegido pela criminalização, um fato abjeto, desprezível, moralmente condenável). No segundo, temos um crime, o de apologia ao crime, previsto no art. 287 exatamente.

O delito do art. 287 é a defesa de crime já praticado. Comete apologia ao crime o sujeito que louva um crime que já foi feito.

A notificação anterior referem-se, isso sim, ao delito do art. 286, também do Código Penal, sob o nomen juris 
incitação ao crime. Portanto, defender que se faça aborto, enquanto ele é considerado crime, e incentivar que ele seja feito (ou defender, incentivar que se use drogas, como o Planet Hemp fazia, mesmo sendo seu uso e comércio criminalizados), constituem o delito em tela. 

Continua válida, porém, a tese de que defender uma mudança na lei para que o que hoje é considerado crime não mais o seja não configura o delito de incitação ao crime, muito menos de apologia de crime ou criminoso.

Art. 286. Incitar, publicamente, a prática de crime:

Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.


Reparem: a conduta é a incitação da prática de crime. O sujeito deve dizer, por exemplo:

.Pratiquem aborto. Ou alguém a uma mulher temerosa de sua gravidez indesejada: Desfaça-te dessa criança. Conheço uma clínica clandestina que faz aborto. Queres vir comigo? Isso é o crime do art. 286.

É a esse crime, de incitação embora tenha falado, erroneamente, em apologia de crime, que é outro delito, distinto. Recapitulando minha resposta: não, não é crime de incitação ao crime.

Há, como vimos, um crime de apologia, no artigo seguinte, o 287, mas nem nesse incorrem as pró-aborto em sua defesa (imoral, absurda, monstruosa etc) da legalização do aborto, dado que a conduta tipificada é a de fazer defesa pública de crime já cometido ou do criminoso que o cometeu.




O estado de necessidade configura-se numa situação de perigo atual ou iminente no qual o sujeito precisa lesar ou destruir bem jurídico alheio para proteger o próprio. Ora, a gravidez resultante de estupro não é estado de necessidade, pois não representa perigo para mãe. A honra e dignidade da mãe não pode ser protegido em detrimento da vida alheia, pois no estado de necessidade o sujeito tem de optar pela maneira menos lesiva, sob pena de estar afastada a excludente da ilicitude.

Fora a questão de ser um atentado à vida, já pensaram no descaso com a coisa pública?

Vejamos, se discriminalizam o aborto, nem todos terão condições de pagar por esta intervenção cirúrgica, o Estado então terá de se comprometer com mais este custo na saúde pública, a ser desta forma, indiscriminadamente, sem educação, todas as mulheres que engravidarem e quiserem se livrar desse fardo por longuíssimos nove meses, farão aborto, eu pagarei, nós pagaremos, para que o Estado continue a não dar educação sexual, pagaremos para que o Estado continue a ser displicente com relação a desmoralização e banalização do sexo na mídia, pagaremos para que os médicos que estariam tratando outros doentes, e que leitos que seriam melhores aproveitados sejam ocupados por todo tipo de desculpas esfarrapadas para se fazer um aborto.

A lei não está pondo mulher nenhuma na fogueira por que o homem terá a obrigação de pagar a pensão à esta criança! Logo o homem que não quiser pagar a pensão também é favorável a prática abortiva... podemos dizer que o nascimento do filho gera obrigação à ambos os lados e portando não há ninguém que seja inoportuno para entrar no debate (seja homem ou mulher).

Isso é cretinice da mãe que sacrifica seu filho para que sua condições de vida seja melhor.

Permita-me fazer analogia à Saturno o deus que para manter-se eterno e jovem comia seus proprios filhos...

A Igreja não é 
contra o aborto como quem fornece uma mera opinião, um um mero achismo sobre o assunto. Ela simplesmente condena esta prática com a autoridade de quem, em matéria de Fé e Moral, goza de infalibilidade. Assim, defensores do aborto são automaticamente excomungados. 

Se estes agentes de Satanás tivessem verdadeira compaixão pela criança e pela família, não desejariam remediar um erro com outro erro, mas forneceriam todo o amparo necessário para que pudessem enfrentar tudo isto dentro dos limites da Lei Natural. Pelo contrário, preferem cometer um ato claramente anti-natural, usando o sofrimento da criança como desculpa, para verem o triunfo de sua ideologia demoníaca.

O fato é que se o aborto tivesse sido consequência de uma intervenção cirúrgica com outro propósito, não seria um assassinato. Suponhamos que uma gestante precisasse remover um câncer através de uma cirurgia e que tal procedimento pudesse ter como consequência não desejada a morte do ser humano que ela traz no ventre. A intervenção médica neste caso seria lícita? Sim. Aqui, a intenção desejada do ato é a de interromper a vida dos dois inocentes. Um assassinato. Um pecado gravíssimo.

De um lado temos a ideia de que qualquer matização quanto ao aborto que foi efetivado é uma adesão às teses de idiotas como o nosso ministro da saúde, de de outro temos os abutres do movimento abortista querendo, de fato, tirar proveito de todo esse drama.

Que sentido deve tomar nossa reflexão aqui?

Bem, em primeiro lugar temos de observar os seguintes princípios:

1) A vida inocente deve ser protegida.

2) Nunca é lícito, nem sequer por razões gravíssimas, fazer o mal para que daí provenha o bem.

3) Comportamentos que exijam um grau de virtude heróico não podem ser exigidos pelo Estado.

Refletindo sobre eles e aplicando ao caso em questão (ida dos princípios à realidade) vemos que o certo seria a mãe seguir com a gestação, mesmo correndo risco de vida, mas, ao mesmo tempo, não se poderia cobrar que o governo só a ajudasse nessa hipótese, dado o grau de virtude necessário para que tal ato se efetive. Gostemos ou não as necessidades práticas também são um imperativo nas políticas estatais e, muitas vezes, teremos conflito com os princípios evangélicos.

Até agora pode parecer que eu estou defendendo o aborto, não é? É evidente que não estou, mas, de fato, estou dizendo que se houvesse risco de morte, exigir que o Estado não desse guarida à possibilidade do aborto, mesmo reconhecendo que isso é pecado, mesmo reconhecendo que a mãe deve enfrentar o perigo, mesmo reconhecendo que admitida a legitimidade de tal conduta teríamos de legitimar a morte da gestante para preservar a do nascituro, seria não entender nada sobre a natureza da vida social.




Mas eis que surge o grande detalhe: não há risco de morte.

O problema da ilicitude do aborto como meio para salvar a vida da gestante foi abordado pela imprensa sem que se perguntasse se tal caso ocorre de fato ou se é mera questão especulativa. É difícil imaginar o caso em que a morte do bebê, por si só, “cause” a salvação da vida da gestante, seja um “meio” utilizado para curá-la. Na verdade, a morte do nascituro não traz benefício algum para a gestante. Convém citar esta declaração da Academia de Medicina do Paraguai (Declaración aprobada por el Plenário Acadêmico Extraordinário em su sesión - 1996):


Ante patologia da mãe ou do feto que surjam durante a gravidez, a medicina moderna, utilizando a tecnologia disponível em reprodução humana, conta com os meios para conservar a vida materna, o fruto da concepção e combater conseqüentemente a mortalidade perinatal. Em casos extremos, o aborto é um agravante, e não uma solução para o problema.


A insistência de certos médicos em indicar o aborto como “meio” (e até como único meio) para salvar a vida de uma gestante parece derivar de uma espécie de crendice. Há médicos que acreditam que o aborto fará “desengravidar” a paciente, levando-a ao estado anterior à concepção do filho. Segundo Alberto Raul Martinez, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, em depoimento de 1967 (Apud João Evangelista dos Santos ALVES et al. Aborto: o direito do nascituro à vida, 1982, p. 85):

... deve-se levar em conta que a reação mais comum do médico não afeito à especialidade ginecológica, quando a prenhez ocorre em uma de suas pacientes já afetadas por problema físico ou mental, é a de que a remoção da gestação poderia simplificar a questão.

Isso, porém, não ocorre. O aborto é uma prática tão selvagem que, além de condenar à morte um inocente, agrava o estado de saúde da gestante enferma.

Mas, detalhe supremo, nem isso tínhamos no caso da menina, pois os problemas eram apenas algo em potência. Não havia nada de concreto.

Sobre este assunto, convém citar a célebre aula inaugural Por que ainda o aborto terapêutico? do médico-legal João Batista de Oliveira Costa Júnior para os alunos de direito da USP de 1965:



Limitar-me-ei, nestas considerações, apenas ao chamado aborto terapêutico, que, na prática, pode confundir-se com o aborto necessário, porque o tempo não me permitiria tratar de todas as outras espécies conhecidas.

(...)

Digo, inicialmente, que se me fosse permitido, chamá-lo-ia de aborto desnecessário ou, então, de aborto anti-terapêutico.

(...)

Antes os processos atuais (1965!!!) da terapêutica e da assistência pré-natal, o aborto não é o único recurso; pelo contrário, é o pior meio, ou melhor, não é meio algum para se preservar a vida ou a saúde da gestante. Por que invocá-lo, então? Seria o tradicionalismo, a ignorância ou o interesse em atender-se a costumes injustificáveis? Por indicação médica, estou certo, não o é, presentemente. Demonstrem, pois, os legisladores coragem suficiente para fundamentar seus verdadeiros motivos, e não envolvam a Medicina no protecionismo ao crime desejado. Digam, sem subterfúgios, o que os soviéticos, os suecos, os dinamarqueses e outros já disseram.

Assumam integralmente a responsabilidade de seus atos.

(...)

...o aborto terapêutico não é o único meio para preservar a vida da gestante, sendo mesmo mais perigoso do que o prosseguimento da gravidez, razão pela qual não poderia, também, o anteprojeto ser aplicado quando fala em um “mal consideravelmente inferior ao mal evitado”.

(...)

Por quê, então, o aborto terapêutico?

Por tudo isso que acabo de dizer, considero a prática abortiva, mesmo no chamado aborto terapêutico, um crime de lesa pátria e de lesa humanidade.

Podemos concluir que existem fortes argumentos contra a ideia de que há um risco de morte num caso como esse e tudo se torna mais absurdo quando sabemos que não estamos tratando de algo concreto, mas de uma probabilidade.

Se a obediência à uma lei humana que se conforma com a Lei Divina requer, em determinadas ocasiões da vida, um elevado grau de virtude, isso não quer dizer que o Estado deva abrir exceções, a ponto de permitir a violação da Lei Natural, da qual ele deve ser guardião. Vá lá que a penalidade dos indivíduos pudesse ser reduzida, etc, etc, mas oferecer amparo legal para se cometer algo que é, sob todas as circunstâncias, ilícito, isso jamais.

A Moral da Igreja não e uma 
Moral de cartilha; ela compreende, antes de tudo, princípios. O caso concreto é avaliado à luz destes princípios e, caso haja contradição, escolhe-se, naturalmente, obedecer ao mandamento, a despeito das consequências que tal obediência possa lograr. Sim, nesta matéria devemos ser inconsequêntes mesmo.


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PARA CITAR ESTE ARTIGO:

Defender o aborto: apologia ao crime?
Rafael Vitola Brodback 02/2012 Tradição em Foco com Roma.

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