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Esportes Radicais


Como devemos pensar em relação aos esportes de risco? Aqueles ditos radicaisdesafiadores, e tudo o mais: alpinismo, pára-quedismo, bungee-jumping (acho que é assim que escreve), e mesmo outros como Fórmula 1, rodeios, touradas, etc, e ainda, atividades circenses. 

Antes de começar, peço para deixarmos de lado a questão 
é ou não é pecado. Sempre digo isso, e aqui eu repito, Deus não espera de nós que somente evitemos o pecado. Isso é a nossa obrigação. A vida virtuosa, a ascese, a busca pela perfeição, exige muito, muito mais. E nos dias de hoje, essa busca é dificultada por questões que não nos são muito claras. 

Dito isso, acredito que deixo bem claro que a questão de se tachar a mera participação nesses esportes de pecado ou não é irrelevante. Não quero saber se é pecado. O pecado geralmente -- geralmente -- nos é bem claro, e fere nossa consciência de forma clara, se esta é reta. Pergunto se isso seria virtuoso e, como cristãos que somos, se poderíamos nos dar ao luxo de apoiar tais práticas.

Minha opinião:

A vida humana é por demais preciosa. É um milagre existirmos, estarmos aqui. Milagre maior do que este, é tudo o que Deus nos dá durante essa existência: nossa família, nossos amigos, nossos namoros, nossos estudos, nosso intelecto, tudo o que aprendemos, nosso trabalho, nossos relacionamentos com as outras pessoas, e, de forma particular, o conhecimento de Si mesmo e Seu chamado pessoal à participação da Sua bem-aventurança, através da Santa Igreja e dos Sacramentos.

Para quem já é bem instruído na fé, começa-se a ter por claro qual é a nossa missão aqui na terra. É trabalhar para o Reino de Deus. É promover a vida, não apenas a vida física, mas a vida moral, a vida espiritual, a vida digna, para nós mesmos e para nossos irmãos em Cristo. É buscar a santificação de todas as coisas e de tudo o que se faz. É, como diz E. Rideau em seu livro Consecration (
Consagração, sem edição em português), consagrar este mundo a Deus.

Sendo assim, eu me pergunto: o esporte, que por si só não contribui diretamente para a salvação -- muito embora ele seja algo, a meu ver, bom, pois expressa uma forma muito paticular de o homem interagir com as pessoas e com o mundo, e se pode tirar proveitos de santidade deste ramo de atividade, além de promover a saúde física, que é um bem por excelência -- pode se dar ao luxo de ser praticado em dimensões que colocam a própria vida em risco? 

Acredito que por radical hoje se entenda o esporte que está ligado com adrenalina, com emoção, que demanda certa coragem para praticá-lo e provoca uma sensação de perigo, de aventura, ainda que o real perigo não exista ou seja bastante remoto.

Falo de esportes, ou de atividades (não precisa ser classificada como esporte em termos canônicos, pois não estamos em um blog esportivo e ninguém vai pegar no nosso pé por isso ) em que o risco de vida é verdadeiramente real, como o alpinismo, por exemplo.

Os defensores destas práticas dirão que a grande motivação para os praticarem é justamente superar limites que pareçam intransponíveis. É uma explicação justa. Cabe-nos porém ponderar se a sensação de vitória, esta busca, que pode muito bem ser uma busca desenfreada, por autorreconhecimento, autossatisfação, meta alcançada, mérito adquirido, é proveitosa, neutra ou prejudicial à vida cristã.

Dando uma de psicólogo, e sendo pessimista, diria que estas necessidades estão ligadas a um sentimento muito profundo de carência. As pessoas não querem ser somente mais uma. Querem ser as tais. Querem ser reconhecidas, mesmo que por si mesmas, como capazes de realizar feitos que outros sequer cogitariam tentar. Isso as faz sentir superiores. Mais: fazem-nas se sentir capazes de vencer qualquer obstáculo na vida, dão-lhes mais autoconfiança e coragem.
Tudo isso tem o seu lado bom, evidentemente. Vencer um campeonato de qualquer coisa, seja de xadrez, seja de futebol, é uma grande sensação de realização pessoal. Porém penso que exista o perigo do orgulho aí, e não só do orgulho como principalmente da vaidade. A ponto de a pessoa (ou o time) derrotada se sentir exatamente isso: uma derrotada. Se não foi capaz de vencer sequer o torneio da várzea municipal, que dirá de desafios mais nobres?

Assim, vamos que o esporte pode moldar a confiança da pessoa tanto para o bem quanto para o mal, dependendo da forma como a pessoa está psicologicamente ligada a este fato isolado.

Na Imitação de Cristo diz mais ou menos assim: muito imprudente é a pessoa que demanda tempo em excesso com as coisas que não lhes aprouvem a salvação.

Nesse sentido, acredito que muitos idolatram o esporte, tomam-lhe como uma referência máxima para sua perspectiva pessoal, passam a ser dependentes da vitória que almejam, como que todo o seu valor enquanto pessoa se resumisse a ser jogador, ou vencedor.

Falei sobre esportes em geral e acabei divagando. Voltando.


Falei tudo isso para dizer que o esporte é bom sim, e ter um objetivo desafiador para superar, pode trazer benefícios à mente e à alma, mas é preciso um preparo, ou, melhor dizendo, uma conscientização do que realmente é prioritário em nossas vidas. As pessoas não têm que se sentir derrotadas por nenhum tipo de frustração esportiva. Aliás, não têm que se sentir frustradas com nada nessa vida: se é bonito ou feio, se é forte ou fraco, se tem boa dicção ou retórica ou é gago e fanho, nada nada nada. Todos temos um valor infinito perante Deus, e foi por nós, por piores que possamos parecer às coisas do mundo, que Ele derramou seu preciosíssimo sangue na Cruz. Nada deveria nos ferir esta convicção. A quem tem Deus, nada falta, diz Santa Tereza.

Sendo assim, o que dizer das pessoas que arriscam a própria vida em algumas atividades que podem ser classificadas como 
superação de limites? Porventura não seriam exatamente essas atividades uma faceta extrema da valorização desta busca por reconhecimento inútil, desnecessário, a ponto de considerar a própria vida como acessória, como moeda de aposta, para essa meta? Não seria a forma mais evidente de que a vida, para esta pessoa, só vale, só tem sentido, com a vitória, a superação, a conquista? 

Muitas vezes, o esporte toma o lugar de Deus na vida das pessoas, e acrescento que isso não se limita aos esportes radicais. Só para exemplificar, existem aqueles fiéis que seguem o amai o seu time sobre todas as coisas e ao torcedor rival como o teu pior inimigo, crêem na Infalibilidade da CBF e tudo mais.

No caso dos esportes radicais, em geral, realmente nota-se um maior individualismo e uma busca constante de auto-superação, que ao meu ver não trata-se de um 
 mal em si. Para deixar claro, creio ser possível e até produtivo à vida espiritual de muitos cristãos a prática de certos esportes ditos  radicais. Falo por experiência própria, pois sou praticante de longas caminhadas por lugares inóspitos, preservados da ação humana e naturalmente encantadores, só trazem benefícios a minha vida espiritual. Quanto ao risco envolvido, certamente é algo a ser pesado, e penso que existam esportes tão perigosos que realmente não convém ao cristão via de regra, como o bungee jump, escaladas sem equipamento, e etc 


Ao meu ver a questão é simples. São duas premissas básicas que deve-se observar:

Primeiro, na prática de qualquer esporte que seja, deve-se sempre ter consciência de que a prática daquele esporte é unicamente para a glória de Deus, e não a nossa. Portanto devemos repreender toda e qualquer vaidade que surja da prática de esportes, e jamais nos desolarmos por uma derrota. Na verdade esse processo de vitória/derrota no esporte, quando a pessoa tem a maturidade espiritual necessária, é até muito produtivo.

E em segundo, deve-se observar todo cuidado possível para com a vida, dom preciosíssimo de Deus, e se for um esporte onde não haja razoável segurança, que não seja de modo algum praticado por um Cristão, pois que não vale arriscar a vida por um capricho, afinal existem muitas opções. Fora isso, que a prática dos esportes nos traga saúde, para termos energia para anunciar a palavra de Deus por muitos anos, e para sermos testemunhas da bondade de Deus para com seus filhos. Que a prática do esporte nos exercite a disciplina, o auto-controle, a concentração e a perseverança, tão necessárias em nossa vida espiritual. E finalmente que o esporte possa ser um meio lícito de se fruir a existência, sem nunca esquecer da prioridade da salvação, levando sempre a presença de Jesus aonde formos.

Exemplo brilhante é a comparação dos bombeiros com os exibicionistas que escalam prédios sem equipamentos. Mostra bem claramente que uma mesma ação pode, dependendo da situação, ser um pecado, uma ação neutra ou até virtuosa.

Porém devemos tomar cuidado, pois satanás é astuto, e certamente usará sempre da nossa própria sabedoria para nos tentar. Uma vez que sabemos que o pecado esta na intenção, devemos vigiar e examinar, sob as luzes do Espírito Santo, cada intenção nossa que nos leva a agir, principalmente se essas ações forem habituais. Seria essa intenção virtuosa, neutra ou condenável?

Se é virtuosa, ótimo, porém cuidemo-nos para que no decorrer da prática dessa intenção, ela não venha a causar o mal a quem quer que seja, e que não nos cegue ou nos ocupe ao ponto de prejudicar outras intenções/ações virtuosas, que Deus espera de nós, tanto ou mais do que essa, o que poderia macular a virtude existente na intenção, transformando uma intenção virtuosa numa atitude condenável por Deus.

Se for neutra, acautelemo-nos, pois que provavelmente tratam-se de desejos pessoais, que apesar de serem lícitos a princípio, muitas vezes contrastam com aquilo que Deus espera que priorizemos em nossa vida, inclusive podendo tomar nosso tempo ao ponto de atrapalhar a prática da virtude.

E se for condenável, tratemos de bani-la de nossa consciência, e não nos eximamos de condená-la aonde quer que seja, sempre com muita caridade.

Creio que ai está um resumo (muito resumido) do que seria uma 
 receita para a prática da virtude, essencial na busca da santidade.

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PARA CITAR ESTE ARTIGO:

Esportes Radicais

David A. Conceição, 02/2013 Tradição em Foco com Roma.

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