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Vejo algo muito comum no meio tradicionalista - do qual faço parte - a facilidade que esses católicos tem de definir por eles mesmo o que é pecado e o que não é. Isto é uma coisa que sempre foi desaconselhada pelo clero e o próprio Santo Inácio de Loyola, quando ainda era leigo, foi muito inquirido pelo clero por causa desta prática - vá lá que no caso dele não se achou erro nas definições que ela dava de pecado, mas nós não somos nem um grão de areia do lado de Santo Inácio.
Temos atentos a esta prática de definir pecado - não digo no geral, pois se a definição for simplesmente a conclusão que se tira de algum princípio da moral católica, ou comentário de algum teólogo, não há problema -, pois podemos estar ferindo a moral e colocando outras pessoas em situação de pecado.
Depois de séculos de livre-interpretação das escrituras, de séculos de relativismo epistemológico em filosofia, de séculos de iluminismo e racionalismo, depois da revolução francesa, depois de séculos de materialismo e consumismo, de centenas de anos de romantismo subjetivista e relativista, depois de um puritanismo exacerbado seguido de um sentimentalismo quietista, depois de cem anos de “biologismo” que nega a diferença entre homem e animal, depois de cem anos de psicoanálise que incentiva e liberação do “id”, depois de cem anos de heresia modernista, depois de duas grandes guerras mundiais e de décadas de guerra fria, depois de décadas de televisão e cinema dominados por inimigos da Igreja, depois de décadas de campanha de liberalismo sexual, depois disso e de muito mais o que sobram de bons costumes e de senso moral na maioria da população?
O pecado não muda; o que pode mudar é a ojeriza que determinado pecado causa a mentalidade de pessoas de certas épocas, mas não se pode tomar isto como se as pessoas em geral encarassem assim, e que por causa destas certas pessoas este pecado deixou de ser pecado.
Isto corresponderia a dizer que a moral muda de tempos em tempos; afrouxa se os costumes da sociedade afrouxam ou se se tornam mais rígidos se a sociedade se torna mais rígida. Estaria então a moral da Igreja submetida aos costumes da sociedade? Se assim for, então neste quesito a Igreja se curva e abranda seus preceitos se o povo é mais degradado.
Não foi isto que aconteceu quando Nosso Senhor esteve entre nós. O povo judeu estava muito mais decadente naquele tempo do que no Antigo Testamento, tanto que ficaram abandonados à própria sorte sem profetas por alguns séculos. Porém, isto não fez com que Nosso Senhor abrandasse as leis, pelo contrário, elas se tornaram mais rígidas: o divórcio foi proibido definitivamente, o adultério ganhou uma definição mais ampla - os que olham para a mulher do próximo com malícia já estão cometendo adultério... enfim, inúmeras coisas.
O que é ficar?
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É um momento de prazer efêmero entre duas pessoas? Então é pecado sim. Atenta contra a castidade, contra a dignidade humana, contra a integridade.
É um momento de afetividade maior com alguém com que se pretenda namorar? Aí o assunto se torna mais delicado.
Entendo que o mundo está estranho, entendo que a situação anda dificil para os homens, que a mulherada dá bota no menor sinal de compromisso MAS... uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.
Amigo é amigo, quer dar uns beijos na amiga por que acha que ela vai ser uma boa namorada, PEDE ELA EM NAMORO, dá um beijo e pronto ou então, o MÁXIMO que consigo aceitar é, a beija e E PEDE EM NAMORO NA MESMA HORA. Concordo que às vezes é mais fácil dar um beijo do que falar “quer namorar comigo” mas depois de dado o beijo não tem por que não falar na mesma hora.
E quando defendo beijo na boca no namoro não defendo beijos erotizados.
Cada coisa tem seu momento e isso deve ser sempre respeitado.
Gostando ou não da questão ficar é pecado, podemos discutir se a atualidade nos dá liberdade para julgar isso, até que ponto nossa mentalidade perturbada pela super exposição ao sensualismo consegue entender isso e esses fatos podem reduzir a gravidade do pecado, mas que é... isso é!
Dom Antônio de Castro Mayer na sua “Carta pastoral sobre problemas do apostolado moderno”, que aliás foi dito pelo professor Plínio Corrêa de Oliveira no livro “Em defesa da ação católica”, diz o que eu afirmei e repito agora: O que era imoral ontem, é hoje e será amanhã. A moral da Igreja, não muda nem no tempo nem no espaço. Negar isto, é autêntico relativismo, que, infelizmente, é a praga principal do mundo moderno.
Um dos sérios problemas de posturas demasiadamente rigoristas moralistas facebookianas é que a pessoa geralmente vai, aos poucos, achando-se puro e desprezando os outros, julgando-os temerariamente e apegando-se a posições suas como se fossem Doutrina da Igreja (não existe nenhuma encíclica “De Osculo”, e decerto nunca haverá).
Um dos problemas de uma visão puritana demais do mundo, acaba gerando distorções graves, pois é dificílimo ao homem ser diligente quanto a todos os aspectos de sua vida. Assim, por exemplo, há algumas décadas atrás era totalmente inconcebível que uma moça saísse sozinha com o seu noivo; mas também era inconcebível que os escravos saíssem de seus grilhões.
Quando citam o enunciado “Quem não age conforme pensa, acaba pensando conforme age” insinuam que os que defendem a possível licitude do beijo antes do casamento, fazem-no devido aos seus costumes corrompidos.
A Igreja nunca defendeu que o beijo é algo pecaminoso. Opiniões de teólogos são opiniões de teólogos. Doutrina da Igreja é Doutrina da Igreja. Ela nos ensina a guardar a castidade. Ensina-nos que a luxúria, a masturbação, a fornicação, a pornografia, a prostituição, o estupro são pecados contra a castidade. Ela não divide o corpo em partes “tocáveis”, “não-tocáveis”; pessoas “beijáveis” e “não-beijáveis”.
Vale lembrar que os valores adotados pelas sociedades são pendulares. Antes, há várias décadas atrás, havia quase uma obsessão com o medo de pecar contra a castidade. Hoje, infelizmente, aconteceu o oposto: a libertinagem corre solta. E eu não duvido nada que um dos fatores que contribuíram para essa libertinagem a partir dos anos 60 foi justamente a repreensão excessiva à afetividades das pessoas, principalmente dos jovens
Como diria o Olavo de Carvalho, deve-se partir sempre do dado da realidade. O que objetivamente, no caso concreto, e não no papel, provoca um atentado à castidade? Eis como interpretar seguramente a doutrina: aplicá-la na prática. Caso contrário, ela se torna letra morta, e caímos no legalismo de superpor a moralidade de palavras à própria realidade que elas procuram explicar -- e não definir.
Eu tenho nojo do que fizeram do beijo. Em tempos remotos, um simples tocar de lábios já era um costume suficientemente estranho para ser, objetivamente, atentado contra a castidade. Hoje, não o seria, e poderíamos muito bem iniciar um namoro com um beijo assim, como manifestação terna de um sadio e puro amor.
Mas o que acontece? A sociedade parece que tem o prazer de contaminar os costumes. Começaram os beijos de língua, as agarrações, as passadas de mão, e hoje o que mais me dá náuseas é ver como o ato do beijo se tornou um verbo (às vezes intransitivo) atuante nas conversas mais corriqueiras: “Você já beijou?” “Esse final de semana ainda não beijei.” “- Cadê Fulano?” “- Ah, tá lá beijando Beltrana.” “”Você beijou Fulana? Se não beijou foi encontro perdido.” “Vou lá beijar e já volto.” Parece que quando um costume finalmente estaria pronto para ser incorporado na sociedade de forma purificada, as pessoas sentem necessidade de descer mais abjetamente ainda no pecado. Isso é revoltante!
Vamos ver o que ensina a Teologia Moral:
Um pecado venial torna-se mortal:
a) pela CONSCIÊNCIA ERRÔNEA: se alguém cre que seja uma palavra grave blasfêmia e, contudo, a profere, blasfema;
b) pelo fim fravemente ilícito do operante: adular uma jovem para seduzi-la;
c) pelo desprezo formal da lei que obriga sob culpa leve;
d) pelo escândalo grave, ou pelo grave dano pode resultar de ma ação levemente má: uma palavra levemente obscena proferida diante de crianças; roubar a agulha da máquina de uma alfaiate, o qual não poderá mais costurar com grave dano seu; e pelo perigo que se corre de pecar gravemente;
e) pela coalizão da matéria, como sucede no furto.
(Greco, Compêndio de Teologia moral, op. cit., 103)
Como eu disse ao longo do artigo, “o conceito de consciência vencivelmente errônea está equivocado”, e está assim até agora. Se lá em 1950 a sociedade cria que beijo era coisa para casamento, de fato, o casal que se beijasse tendo consciência que é um pecado grave, estaria pecando gravemente, não por que a matéria era má, não por causa do objeto, mas por causa da consciência vencivelmente errônea. E mais, o contrário também é verdadeiro, se nos dias de hoje, nenhum casal crê que o beijo antes do matrimônio é pecado, não vai pecar por isto. Pode acontecer de haver pecado nas carícias que estimulam os prazeres carnais - mas aí não é mais por causa da consciência, mas por causa do OBJETO -, mas não no beijo.
De fato, o beijo entra na “lista” de atos que Del Greco diz serem “libidinosos”, ou exitantes. Mas, isso não acarretaria pecado mortal, a não ser pela consciência errônea, ou laxa, que é uma consciência errônea peculiar.
Porém, volto a expressar a doutrina do Olavo: deve-se partir do dado da realidade. Não é a doutrina que dita como é a realidade, mas o contrário. Até com a doutrina dogmática e revelada por Deus é assim. A doutrina não muda a realidade, mas a explica e a contextualiza. E mais, qualquer doutrina, quando expressa em palavras, inevitavelmente perde grande parte da sua substância, pois é impossível, por detalhado que seja um compêndio de teologia, abarcar com meras palavras todas as instâncias de determinado ato. A letra, pela sua própria natureza, é restritiva.
Nesse sentido fica claro que algo que é objetivamente mau em uma época pode não o ser em outra. Existe uma diferença entre algo objetivo e algo essencial. Objetivo é algo que acontece de fato na realidade, independente da sua essência ou de seus acidentes. Um casal que violou os costumes de sua época e, com isso, caiu na luxúria, cometeu um pecado objetivamente. Isso aconteceu historicamente, é fato, é real, e foi sentido e vivido por eles. Mas o pecado engloba aqui as circunstâncias, não a essência. Aliás, se só pudéssemos pecar só por essência, não haveria realidade, pois a própria consciência, por mínima que seja, do pecado, é algo externo ao ato, no entanto é necessário para caracterizar pecado.
Quando o puritano diz, por exemplo, que o beijo na boca em solteiros é fonte de tentação para ambos os sexos, o que é isso senão uma relação de causa e efeito que para existir depende de todo um contexto cultural? Claro, se realmente há tentação, o ato é objetivamente pecado, mas não é essencialmente. Porque a tentação não necessariamente vem do ato, mas pode vir de fatores completamente externos: a forma como as pessoas lidam psicologicamente com o próprio corpo, a noção de sexualidade, os costumes semelhantes que nada podem ter a ver com a sexualidade (“selinhos” entre homens em certas culturas, é algo completamente desligado de qualquer conotação sexual), e por aí vai.
Não estou, com isso, procurando defender esse ou aquele costume de nossa época. A situação é tão caótica e paradoxal que é muito difícil avaliarmos moralmente cada único gesto em cada possível circunstância. Eu lembrei do selinho entre os russos, mas isso não significa que eu apoie o “selinho” que está virando moda hoje, pois isso é um costume estranho introduzido em nossa cultura, é uma banalização de um gesto que se reservava à afetividade dos casais (mesmo sem despertar desejo sexual). Também não ignoro que o beijo pode continuar sendo exatamente o que o teólogo apontou: fonte de tentação para o pecado. Quantos casais de namorados (ou “ficantes”) não terminaram na cama por causa de um beijo? Onde tudo começou com um beijo? Mas, quantos casais castos, que têm um profundo e sincero conhecimento e domínio da sua sexualidade, não conseguem viver na pureza e, mesmo assim, trocando beijos?
Uma coisa não exclui a outra. Conhecer o princípio da moralidade das coisas é algo intrínseco à ordem buscada por todo ser humano. Ela só “turva” a “comunhão com Deus e o próximo” se for buscada de forma desordenada, acomodada. Mas isso é um outro mal, infelizmente muito frequente nas pessoas, que deve ser combatido. Ele não exclui a necessidade de conhecermos os princípios da lei moral que, como expliquei acima, não são formulações religiosas apenas, mas definições da própria realidade.
Não vou nem entrar na questão do rigorismo que reina em certos ares ser algo totalmente condenado pela Igreja, e presumo que o assunto já está bastante esclarecido.
Aliás, só é possível uma verdadeira “comunhão com Deus e com o próximo” quando buscamos a verdade em sua plenitude, e não aquilo que nós acreditamos ser a verdade, ou que nós acreditamos ser apenas as verdades relevantes, e que as outras são insignificantes e não devem ser discutidas ou sequer pensadas. Isso é muita pretensão. É tomar o lugar de Deus em nossos juízos particulares. Diz-se com muita propriedade que a humildade é a mãe das virtudes, e a primeira manifestação da humildade é nos reconhecermos incapazes de emitir juízos morais pela nossa própria inteligência. Por isso precisamos do auxílio de Deus, para que nos revele o que é, objetivamente, o certo e o errado.
Aliás, o que é a verdade?
“A verdade”, no singular, não é o conjunto de todos os fatos “verdadeiros” que se pode imaginar, mas a correta correspondência entre nossos juízos e a realidade. Se nos contentamos apenas em formular juízos sobre as verdades que acreditamos ser as “importantes”, simplesmente não praticamos a busca da “verdade” propriamente dita. Ou você está aberto à realidade, com todas as suas nuances e dificuldades, mesmo que para isso precise se dobrar à à fé e ao apelo da graça divina, ou você não está aberto à realidade. Simples assim.
É doutrina católica: se os jovens namorados se guardam em direção ao Matrimônio é porque alguém da Igreja, seja a militante, padescente ou gloriosa rezou por ele. Por isso orate frates!