.

A salvação dos não-católicos


Medir palavras não é característico do Ecumenismo. O Ecumenismo precisa pautar-se na Verdade, até porque só se pode dialogar rumo à união, sabendo perfeitamente o que o outro pensa.

Em outras palavras, não há necessidade, nem aqui, nem em qualquer outro lugar, de ninguém mesclar a Verdade. Basta explicá-la corretamente. Verdade é que até a frase "Fora da Igreja não há salvação" pode, se não for bem explicada, ser entendida de maneira herética, como se não pudesse haver salvação para os que se encontram fora do Corpo da Igreja. 

Crer em Cristo inclui em crer e seguir tudo o que Ele nos pros. E a Bíblia mostra , - se a lermos direitinho e interpretada corretamente -, veremos que Ele fundou uma única Igreja. Sobre ti edificarei a MINHA Igreja. Então, além dela ser espiritual ela é também temporal e com uma estrutura visível, para que ninguém se perdesse no caminho.

Ele deixou bem claramente as notas que a identificam para que nos achegassemos a Ele e recebessemos os frutos de Sua paixão.

Aliemos a Bíblia mais a história devidamente contada, e chegaremos em Sua Igreja.

O que tem acontecido hoje em dia por conta de não poder mais se defender tantas portas de seitas abertas? Torna-se um relativista - afinal como vou dizer quem sou ? - ou ateu... Afinal, olhou para tantos lugares, ouviu tanta coisa, viu tanta doutrina diferente, pregações distorcidas, que acabou não crendo nem em Deus.

Infelizmente é o caminho que muitos protestantes tem seguido e isto é mal para o Corpo de Cristo - no real sentido da palavra.

O católico praticante não, pode acontecer o que for, humanamente falando - que ele sabe a quem pertence e em que Igreja está. Fica firme, obediente e não tem medo de dizer em quem crê e o que crê.

Entre os irmãos ortodoxos, há muitos que são hostis ao catolicismo, tanto quanto podem ser os protestantes. Em termos de ecumenismo, não há diferença. Os ortodoxos têm conosco muitas tradições e doutrinas em comum, mas em relação a estar dentro ou fora da Igreja não há diferença: ou se está dentro da Igreja, ou se está fora dela. Não há meio-termo.

Isso significa dizer que, em relação aos erros que professam, os ortodoxos não estão em melhor situação do que os protestantes. O cisma não é algo melhor do que a heresia. Aliás, engana-se muito quem pensa assim. Marcos de Santo Teresa, no Compêndio Moral Salmanticense, considera que o cisma, por natureza, é o que separa da comunhão com a Igreja, e a heresia nada mais é do que uma forma de ser cismático.

Sigamos o ecumenismo, tanto com os irmãos ortodoxos, quanto com os irmãos protestantes, quanto com os irmãos nestorianos e monofisistas. Dentre eles, há quem possa não estar em pecado mortal, e, portanto, está unido espiritualmente à Igreja. E, mesmo os só batizados, conservam um elo com a Igreja Católica, tanto que permanece neles o dever de cumprir todos os preceitos da Igreja que lhes dizem respeito:

D-864. Cân. 8. Se alguém disser que os batizados estão de tal modo livres e isentos dos preceitos da Santa Igreja, quer constem por escrito ou por tradição, que não estão obrigados a guardá-los, salvo se, por sua livre vontade, quiserem sujeitar-se a eles — seja excomungado. (Concílio de Trento)

Pode-se se salvar pela Igreja de duas maneiras: com incorporação real ou pertencendo-lhe em voto. Todos os que têm caridade pertencem à Igreja em voto.

Alguns teólogos distinguem o Corpo e a Alma da Igreja. Desta forma, salvar-se-iam todos os que pertencem à Alma da Igreja. Os não-batizados, bem como os hereges e cismáticos, não pertencem ao Corpo da Igreja, mas poderiam pertencem à Alma da Igreja.

Outros teólogos já dão uma solução diferente e mais perfeita: da mesma forma como a alma humana não se estende além do corpo do homem, a Alma da Igreja não compreende uma extensão além do Corpo da Igreja. Para salvar-se é necessário pertencer ao Corpo-animado da Igreja, mas há duas maneiras de pertencer ao Corpo-animado da Igreja: de fato ou em voto. Nesta solução, a Alma da Igreja é o Espírito Santo, que a informa e vivifica.

 A segunda solução é mais perfeita, porque, quando se não se identificam entre si o Corpo e a Alma da Igreja, ofusca-se a visibilidade perfeita da Igreja, e corre-se o risco de distinguir entre uma Igreja visível e outra invisível. Pio XII salientou, na Encíclica "Mystici corporis":
.
"14. Que a Igreja é um corpo, ensinam-nos muitos passos da sagrada Escritura: "Cristo, diz o Apóstolo, é a cabeça do corpo da Igreja" (Cl 1,18). Ora, se a Igreja é um corpo, deve necessariamente ser um todo sem divisão, segundo aquela sentença de Paulo: "Nós, muitos, somos um só corpo em Cristo" (Rm 12,5). E não só deve ser um todo sem divisão, mas também algo concreto e visível, como afirma nosso predecessor de feliz memória Leão XIII, na encíclica "Satis cognitum": "Pelo fato mesmo que é um corpo, a Igreja torna-se visível aos olhos". (4) Estão pois longe da verdade revelada os que imaginam a Igreja por forma, que não se pode tocar nem ver, mas é apenas, como dizem, uma coisa "pneumática" que une entre si com vínculo invisível muitas comunidades cristãs, embora separadas na fé."

.
Padre Leo Trese coloca como pertencentes a esta alma da Igreja os cismaticos, hereges e os excomungados e não os não-batizados.

Ele diz: "Uma pessoa passa a ser membro da Igreja pelo Batismo e continua a se-lo enquanto dela não se separar por:

-cisma ( negação ou contestação da autoridade papal)

-heresia ( negação de uma ou mais verdades da fé proclamadas pela Igreja)

-excomunhão (exclusão da Igreja por certos pecados graves sem arrependimento).

Mas mesmo essas pessoas, se forem batizadas validamente, permanecem basicamente suditos da Igreja e estão obrigadas a cumprir as suas leis, a não ser que delas sejam dispensadas especificamente.

 O dom da caridade sobrenatural não é conferido apenas no batismo, mas é conferido ordinariamente no batismo. Os que alcançam a justificação pelo batismo de desejo, possuem o dom da caridade, como diz o Santo Ofício na famosa carta ao arcebispo de Boston:

"E não se deve nem mesmo pensar que seja suficiente um desejo qualquer de aderir à Igreja para que o homem seja salvo. Exige-se, realmente, que o desejo mediante o qual alguém é ordenado à Igreja seja moldado pela perfeita caridade; e o voto implícito não poderá ter efeito se o homem não tiver a fé sobrenatural"

.
Os não batizados também podem se salvar. Aliás, é este o assunto principal da carta mencionada acima. De outra forma, não haveria santos que morreram catecúmenos. Quando Pe. Leo Trese coloca como pertencentes à Alma da Igreja alguns cismáticos, heréticos e os injustamente excomungados, tem necessariamente que incluir os catecúmenos, que, como os tais, não pertencem ao Corpo da Igreja.

Mas a sentença a que adere o Pe. Leo Trese, que é a dos teólogos mais antigos, de considerar a Alma da Igreja mais extensa do que o Corpo da Igreja, não é a que considero mais perfeita, como pode ser visto no comentário acima feito por mim. A sentença dos teólogos mais recentes, da época de Pio XII, inclusive o Pe. Penido, considerava uma coisa só o Corpo-animado da Igreja, e dizia que a ele se poderia pertencer de fato ou em voto.

Quanto aos batizados, ainda que hereges e cismáticos, permanecerem como súditos da Igreja, isso é certo, e eu, inclusive, já mencionei aqui e citei o Concílio de Trento a esse respeito. 

A Igreja não tem por costume fazer leis para os hereges e cismáticos, mas isso não significa que não tenha poder para isso. Ela pode, por exemplo, legislar sobre os impedimentos matrimoniais que devem ser levados em conta num casamento protestante. Acho que esse seria um exemplo. 

O Papa Emérito Bento XVI aboliu uma cláusula do Direito Canônico, tornando inválido muitos casamentos de batizados fora da Igreja Católica, aqueles que tinham saído por ato formal de defecção da fé católica. Esses não poderão ter mais um casamento válido fora da Igreja, se bem me lembro da nova resolução.

Esse seria um exemplo de como as leis da Igreja podem interferir na vida dos batizados fora da Igreja. 

Outro exemplo em relação aos batizados estarem sujeitos à Igreja, era o fato de que, quando vigorava a Inquisição, estes estavam sujeitos às sanções penais por parte da Igreja, quando cometiam o crime de heresia ou outros crimes. Os judeus, que não eram batizados, não podiam ser processados pela Inquisição.  

Claro, os judeus ibéricos muito reclamam de terem sido perseguidos pela Inquisição, mas o que ocorreu na Península Ibérica foi que os reis, quando não expulsaram, promoveram uma conversão forçada dos judeus ao cristianismo, tornando-os cristãos novos, portanto, batizados. A Inquisição de Portugal e Espanha era a Inquisição Régia, estava mais sujeita ao Estado do que à Igreja. 

 A salvação "fora" da Igreja por ignorância era a excessão que confirma a regra tive como base o ponto 22 do Gaudium et Spes visando que um cristão-não católico poderia participar da graça da Igreja de Cristo.
 
Cristo, o homem novo

22. Na realidade, o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente. Adão, o primeiro homem, era efectivamente figura do futuro, isto é, de Cristo Senhor. Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a sua vocação sublime. Não é por isso de admirar que as verdades acima ditas tenham n'Ele a sua fonte e n'Ele atinjam a plenitude.

«Imagem de Deus invisível» (Col. 1,15), Ele é o homem perfeito, que restitui aos filhos de Adão semelhança divina, deformada desde o primeiro pecado. Já que, n'Ele, a natureza humana foi assumida, e não destruída, por isso mesmo também em nós foi ela elevada a sublime dignidade. Porque, pela sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-se de certo modo a cada homem. Trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, excepto no pecado.

Cordeiro inocente, mereceu-nos a vida com a livre efusão do seu sangue; n 'Ele nos reconciliou Deus consigo e uns com os outros e nos arrancou da escravidão do demónio e do pecado. De maneira que cada um de nós pode dizer com o Apóstolo: o Filho de Deus «amou-me e entregou-se por mim» (Gál. 2,20). Sofrendo por nós, não só nos deu exemplo, para que sigamos os seus passos, mas também abriu um novo caminho, em que a vida e a morte são santificados e recebem um novo sentido.

 O cristão, tornado conforme à imagem do Filho que é o primogénito entre a multidão dos irmãos, recebe «as primícias do Espírito» (Rom. 8,23), que o tornam capaz de cumprir a lei nova do amor. Por meio deste Espírito, «penhor da herança (Ef. 1,14), o homem todo é renovado interiormente, até à «redenção do corpo» (Rom. 8,23): «Se o Espírito d'Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos habita em vós, Aquele que ressuscitou Jesus de entre os mortos dará também a vida aos vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que em vós habita» (Rom. 8,11). É verdade que para o cristão é uma necessidade e um dever lutar contra o mal através de muitas tribulações, e sofrer a morte; mas, associado ao mistério pascal, e configurado à morte de Cristo, vai ao encontro da ressurreição, fortalecido pela esperança.

E o que fica dito, vale não só dos cristãos, mas de todos os homens de boa vontade, em cujos corações a graça opera ocultamente. Com efeito, já que por todos morreu Cristo e a vocação última de todos os homens é realmente uma só, a saber, a divina, devemos manter que o Espírito Santo a todos dá a possibilidade de se associarem a este mistério pascal por um modo só de Deus conhecido.

Tal é, e tão grande, o mistério do homem, que a revelação cristã manifesta aos que crêem. E assim, por Cristo e em Cristo, esclarece-se o enigma da dor e da morte, o qual, fora do Seu Evangelho, nos esmaga. Cristo ressuscitou, destruindo a morte com a própria morte, e deu-nos a vida, para que, tornados filhos no Filho, exclamemos no Espírito: Abba, Pai.

Referências:

Pequena explicação sobre o sacrifício, baseada em obra do Pe. Emanuel (um espiritual francês do século XIX).

Diadoco de Fótice, Cien Capítulos, 77, ed. Ciudad Nueva

A Próxima Cristandade (Philip Jenkins, Ed. Record)

Pe. Frederick William Faber. The Precious Blood, or: the Price of Our Salvation (O Preciosíssimo Sangue, ou: o Preço da Nossa Salvação), 1860, p. 316.

.

PARA CITAR ESTE ARTIGO:

A salvação dos não-católicos
David A. Conceição 04/2013 Tradição em Foco com Roma.

Grupo Tradição - Vaticano II acesse:


CRÍTICAS E CORREÇÕES SÃO BEM-VINDAS: 

tradicaoemfococomroma@hotmail.com

 

©2009 Tradição em foco com Roma | "A verdade é definida como a conformidade da coisa com a inteligência" Doctor Angelicus Tomás de Aquino